A tensão entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte aumentou
recentemente, com agressões e advertências verbais, além de alguns
movimentos militares, o que gerou uma preocupação sobre uma nova crise
entre duas potências nucleares.
Veículos de comunicação como o jornal americano
The New York Times
e o britânico
The Guardian
chegaram a citar a possibilidade de um conflito e compararam o momento
atual como a Crise dos Mísseis de Cuba, de 1962. Afinal, seria essa a
crise nuclear mais preocupante em 50 anos?
Há um consenso de que a solução militar não seria a melhor para as
diferenças entre os dois países e que, assim como fizeram soviéticos e
americanos há quase 55 anos, Donald Trump e Kim Jong-un resolverão seus
problemas na mesa de negociações.
O conflito
A crise atual se intensificou em 8 de abril, quando, após um teste de
míssil frustrado pela Coreia do Norte, Trump disse ter enviado uma
"armada muito poderosa" para a península coreana, uma referência ao
porta-aviões USS Carl Vinson e a um grupo tático.
Por sua vez, o Exército norte-coreano exibiu no último fim de semana
seu arsenal militar e tentou fazer um novo teste de mísseis de médio
alcance. O exercício falhou novamemnte - o dispositivo explodiu pouco
após o lançamento.
Estava marcado para o mesmo dia o início de uma visita do
vice-presidente americano, Mike Pence, à Ásia, que tem a Coreia do Norte
como um dos principais temas de sua agenda. "A era da paciência
estratégia (com Pyongyang) terminou", disse ele na segunda-feira, em
visita à Coreia do Sul.
A resposta da Coreia do Norte foi breve, vinda de um alto diplomata do
país: "Se os Estados Unidos planejam uma ofensiva militar, vamos reagir
com um ataque nuclear preventivo".
A escalada de tensão alcançou um nível já considerado por alguns como a maior ameaça nuclear em 50 anos. O
The New York Times
classificou como uma "Crise dos Mísseis de Cuba em câmera lenta".
"Quando as ambições nacionais, o ego pessoal e um arsenal mortífero se
misturam, as possibilidades de erro de cálculo se multiplicam", disse o
jornal
.
Já o
The Guardian
afirmou que "nesse momento, a maioria das armas nucleares do mundo
estão nas mãos de homens para quem a ideia de usá-las está se tornando
factível", numa referência a Jong-um, Trump e o presidente russo,
Vladimir Putin.
Em Cuba, o episódio é lembrado como a "Crise de Outubro". No dia 15
deste mês em 1962, um avião espião dos EUA descobriu instalações na ilha
que pareciam corresponder a mísseis nucleares de médio alcance, o que
fez o governo de John F. Kennedy cercar Cuba imediatamente, enquanto
navios soviéticos avançavam rumo à ilha.
Entre 22 e 27 de outubro daquele ano, o mundo experimentou o que era
sentir-se à beira de uma guerra nuclear. Finalmente, negociações entre
Moscou e Washington permitiram que o arsenal nuclear instalado na ilha
voltasse à Rússia, enquanto um furioso Fidel Castro culpava os
soviéticos de terem negociado pelas suas costas.
O prêmio Nobel da Paz e físico a favor do desarmamento nuclear Joseph
Rotblat qualificou a crise dos mísseis como "o momento mais
aterrorizante" da sua vida. Seria a crise atual o momento mais crítico
desde então?
Sobrevivência
Para Bates Gill, especialista em relações entre Estados Unidos e Ásia
da Universidade Nacional da Austrália, trata-se de um pico da tensão
nuclear em décadas.
"A situação mudou drásticamente nos últimos três anos por causa do
desenvolvimento de armas nucleares pela Coreia do Norte, e isso pede uma
abordagem diferente, com urgência", afirma ele, para quem "a
expectativa da administração Trump de esperar que a Coreia do Norte se
desfaça de seu arsenal nuclear claramente não funcionou".
Em contrapartida, Robert Einhorn, especialista em segurança e política
externa do Instituto Brookings, de Washington, afirma que hoje nos
encontramos "muito longe de estar à beira de um confronto nuclear como
em 1962". "Não é tão preocupante como muitos dizem, mas a situação é
claramente tensa por causa das declarações da Coreia do Norte", diz.
Ainda que não acredite na possibilidade de uma guerra nuclear, Einhorn
afirma que "será muito difícil que o governo de Trump convença os
norte-coreanos a eliminarem seu programa nuclear". O especialista afirma
que, para Pyongyang, essas armas são consideradas garantias da
sobrevivência do regime.
Apesar de afirmar que o momento atual reflete a maior tensão entre as
duas potências em décadas, Gill diz que a crise diplomática não se
resolverá com mísseis por duas razões: as declarações do governo de
Trump e a pressão que a China pode exercer sobre Pyongyang.
"Duvido de uma guerra nuclear. O governo Trump vem declarando querer
esgotar todos as vias diplomáticas e pacíficas. A opção militar seria a
última, a menos que exista uma ameaça iminente."
Depois da crise em Cuba, Estados Unidos e União Soviética só voltaram a
acender o sinal de alerta nuclar em 1983, com uma série de exercícios
militares da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), tidos
pela Rússia como um possível ataque atômico. Soviéticos preparam mísseis
e alertaram suas bases na Alemanha Oriental e na Polônia.
O incidente teve uma repercussão menor que a crise cubana, mas ainda é
considerada por historiadores como a maior relacionada a armas nucleares
desde 1962 - até agora.
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